Possibilitar que o bebê venha ao mundo em um ambiente com baixa luminosidade é mais tranquilo para a gestante.

O nascimento pode e deve, sempre que possível e sem criar riscos, acontecer da maneira que uma mulher deseje, tanto do ponto de vista físico quanto emocional. O ambiente deverá ter, sem dúvida, todo suporte técnico e vigilância, mas a atmosfera deverá ser segura, “familiar”, calorosa, carinhosa e alegre.

O nascimento é uma vivência única e pode representar a maior experiência criativa na vida de uma mulher. Nós, obstetras, temos que nos empenhar em criar e oferecer os meios e o “cenário” adequados para que este momento seja vivido sem inibições, com liberdade e profunda intensidade.

Além da cumplicidade e da relação plena de afeto entre a parturiente e a equipe assistencial, o ambiente deverá ser silencioso e “respeitoso”, condizente com o clima de “ritual” que deve prevalecer na chegada de um novo ser ao nosso mundo. A temperatura da sala de parto deve ser agradável para mãe e bebê.

A intensidade da luz deve ser reduzida, como se requer nos momentos mais amorosos, íntimos, inclusive sexuais. A penumbra- noção que deriva de um vocábulo latino composto: paene (?quase?) e umbra (?sombra?) – nos predispõe ao relaxamento, ao enlevo, ao recolhimento, à introspecção, permitindo, como me ensinou Frederick Leboyer defendendo a tese do “nascimento sem violência” – o chamado “Parto Leboyer”- que a parturiente entre num “ensimesmamento”, num verdadeiro “estado de graça”.

De acordo com estes princípios, desde os anos 70, adotei o ambiente do parto com luzes muito reduzidas e sem utilizar o foco da lâmpada cirúrgica sobre a mãe ou bebê. Naquela época, muitas gestantes me pediam para fazer o “parto no escuro”.

O processo do parto e do nascimento deixa a mulher num verdadeiro estado alterado de consciência que se deriva do bloqueio do neocórtex, o qual é dominado pela adrenalina/noradrenalina, neurotransmissores ativados na luminosidade excessiva, na vigília, no pensar, no conversar, no raciocínio, nas emergências, no perigo.

As luzes fortes são um dos fatores que comprovadamente estimulam o neocórtex humano. Ao escurecer do dia (ou com a redução da iluminação) passa a predominar o paleocérebro ou páleocórtex, onde se situam áreas mais primitivas (sistema límbico, constituído pelo hipotálamo e pela hipófise), que estão associadas aos reflexos mais primordiais, espontâneos, não racionais, digamos, mais animais. Afinal, nada mais somos que mamíferos humanos. Com isso, é estimulada a liberação adequada de neurotransmissores, entre os quais, o hormônio denominado ocitocina que promove as contrações uterinas, indispensáveis para desencadear e manter a boa dinâmica do trabalho de parto. Estas observações permitem concluir que um ambiente “à meia-luz” é elemento facilitador ao processo do nascimento.

A adrenalina e a ocitocina são competidores; quando um é produzido em maior concentração, inibe a ação do outro. É por este fato que um mamífero quando vai parir, para se sentir seguro, protegido contra os eventuais perigos, principalmente dos predadores naturais, busca um local aquecido, menos iluminado e mais isolado, onde não possa ser observado.

Destaquemos que é no crepúsculo, ao escurecer, nos finais de dia, que os animais se recolhem, se aconchegam e também quando o nosso centro do sono é ativado para o necessário repouso.

Os efeitos da luminosidade e da penumbra podem ser evidenciados pela realização do eletroencefalograma (EEG), teste que avalia a atividade elétrica espontânea do cérebro. É um exame simples, no qual os impulsos elétricos do cérebro são amplificados e registrados em papel através de um gráfico.

Nossos neurônios funcionam e se comunicam na base de impulsos elétricos e tem um padrão gráfico dito “normal”, quando são naturalmente gerados. Certas condições como ruídos, situações estressantes, luzes intensas, sobretudo pulsáteis, medicamentos sedativos, cafeína e outros podem interferir e causar mudanças no ritmo e intensidade da atividade cerebral que são nitidamente reconhecidas durante um eletroencefalograma.

Estes conceitos já vêm sendo abordados há muitas décadas através da etologia (estudo do comportamento de uma espécie animal) comparando os mamíferos humanos e não humanos, em escritos de estudiosos como Ashley Montagu (1988) e observações do obstetra francês, Michel Odent em sua obra “Birth Reborn”, de 1984.

Artigo original no Portal Minha Vida: https://goo.gl/J4EGt9