Milhares de mulheres perdem o seu útero anualmente quando na verdade poderiam ter tratado as anomalias intra-uterinas, conservando a integridade e a fertilidade deste órgão matrix. Uma das melhores alternativas a uma cirurgia mutiladora como é a histerectomia é realizar os tratamento através de um método avançado e de alta tecnologia: a vídeo-histeroscopia operatória. Ela projeta num monitor de TV as imagens das doenças do útero, e realiza o tratamento sem que se abra o ventre da paciente.

foto2<img171|left>

A medicina conta atualmente com recursos avançados para evitar a histerectomia – a retirada do útero devido a doenças que, em sua grande maioria, não requerem um procedimento tão radical para serem curadas. É alarmante o número de mulheres que perdem o seu útero anualmente, alertam os especialistas. Nos Estados Unidos, entre 700 e 800 mil mulheres são histerectomizadas por ano. “Como o Brasil tem pouco mais da metade da população americana, estima-se que entre 350 e 400 mil mulheres percam o seu útero por ano no país”, calcula o Professor Doutor em Ginecologia e Obstetrícia pela UNICAMP, Claudio Basbaum.

Técnica e tratamento

Ele afirma que, com exceção dos casos em que a histerectomia é imprescindível, não vale a pena correr os riscos desta cirurgia se existem alternativas eficientes e menos invasivas. Anomalias intra-uterinas como pólipos, miomas, cicatrizes (sinéquias) e anomalias congênitas são hoje diagnosticadas e tratadas pelo recurso acurado da vídeo-histeroscopia. No caso de sangramentos não originados por pólipos ou miomas, o tratamento é feito pela ablação histeroscópica do endométrio (retirada da camada que reveste internamente o útero).

Através da vídeo-histeroscopia não é preciso mais expor o ventre da paciente para tratar o seu útero. O acesso ao órgão é obtido por via vaginal. A técnica utiliza um aparelho chamado vídeo-histeroscópio, que projeta num monitor de TV as imagens do interior do útero com nitidez impressionante. É como assistir na televisão às filmagens de uma expedição a uma caverna. Isso porque, o aparelho é constituído por um finíssimo cabo óptico (três milímetros de espessura) com uma câmera miniatura. A este cabo é acoplado o também delgado cabo de luz, tão intensa que permite a nítida visualização da cavidade através de um monitor de TV de alta resolução. Ao contrário do que se imagina, o sistema é tão delicado que nem requer anestesia para os exames diagnósticos.

Na vídeo-histeroscopia operatória, é acoplado a todo este sistema de ressectoscópio, isto é, uma alça cortante que permite uma descarga eletrofulgurante. Ela retira as formações anômalas da camada interna do útero e cauteriza o local ao mesmo tempo. “Nesta alça é descarregada uma eletrofulguração com temperatura para corte e coagulação perfeitamente regulável” – explica o Dr. Basbaum. Para a cirurgia, a paciente recebe anestesia peridural e, em alguns casos, sedativo. Ao invés de perder o útero, ela trata de doenças que levam a hemorragias e esterilidade, num procedimento operatório mais simples, mais seguro, mais eficaz e menos danoso que a histerectomia.

Indicações

PÓLIPO. É um tipo de carne esponjosa de poucos centímetros que cresce na parede interna do útero. Sangra irregularmente e, no período menstrual, de forma intensa, levando muitas mulheres à anemia. “Às vezes, devido a sua dimensão ou localização, os pólipos não são reconhecidos pela ultra-sonografia. Desta forma, alguns médicos são levados a prescrever tratamentos hormonais complexos, sem solução. Quando há sangramentos intensos, estas mulheres são submetidas a curetagens, correndo o risco de formação de cicatrizes intra-uterinas ou obstrução do orifício das trompas” – alerta o Dr. Basbaum. “A vídeo-histeroscopia diagnóstica permite reconhecer nitidamente os pólipos. Já na operação, podemos decepá-los, muitas vezes, com um só golpe de alça – um gesto que pode durar apenas um minuto.”

MIOMA. Formação muscular ou fibromuscular como uma pelota, que cresce na parede intra-uterina, deformando a cavidade do órgão. É mais firme que o pólipo e leva a hemorragias severas. Também sangra irregularmente. “Através da vídeo-histeroscopia, numa técnica de fatiamento, seccionamos passo a passo este mioma até a sua base. Às vezes, o mioma tem um talo que, não muito grosso, pode ser cortado em dois movimentos da alça. Desta forma, ele é retirado como se corta o cabo de uma fruta numa árvore. Muitas mulheres tiveram e têm o seu útero retirado por causa desta doença, o que é uma aberração” – relata o especialista.

CICATRIZES INTRA-UTERINAS (SINÉQUIAS). São estruturas fibrosas que em geral se formam dentro do útero devido a infecções ou curetagens por sangramento uterino anormal ou por abortamento. “Anteriormente, as sinéquias eram mal reconhecidas e tratadas às cegas, através de curetagem para arrancar bruscamente estas cicatrizes. A vídeo-histeroscopia permite reconhecer com precisão onde estão as sinéquias e retirar cada uma delas, deixando a cavidade uterina livre e capaz de alojar e desenvolver o embrião.”

ANOMALIAS CONGÊNITAS. Entre várias, há a existência de um septo, isto é, uma parede que divide o útero ao meio. O útero dividido é incompatível com a fertilidade. “Através da vídeo-histeroscopia, ressecamos esta parede sob visualização direta, num procedimento que leva menos de uma hora.”

SANGRAMENTOS ANORMAIS. Metade das mulheres que perdem o seu útero apresenta este tipo de problema sem que ele seja causado por pólipos ou miomas. Os sangramentos anormais podem ter origem numa disfunção hormonal dos ovários. O Dr. Basbaum explica como combater esta anomalia através da vídeo-histeroscopia.

“Quando a zona-alvo do problema é no revestimento interno do útero, ressecamos este tecido e cauterizamos a sua base. Com a eletrofulguração, retiramos praticamente todo o endométrio (camada interna que reveste o órgão), preservando apenas uma porção na parte baixa da cavidade uterina. Esta porção mais baixa não é funcional, ou seja, não sangra ciclicamente. Desta forma, corrigem-se as hemorragias genitais e suas conseqüências (debilidade física, anemia etc.) sem a necessidade de um gesto traumático e mutilador que é a retirada do útero.”

Este método chama-se ablação histeroscópica do endométrio. É indicado às mulheres com plano familiar completado e resistente aos tratamentos hormonais. O especialista observa que um dos fatores importantes que também causa os sangramentos uterinos anormais é a ligadura de trompas feita com fins de esterilização, principalmente quando realizada no ato de uma cesariana. Ele explica: “Este procedimento compromete com freqüência a circulação dos ovários, alternando a produção dos hormônios femininos, com conseqüente alteração menstrual, hemorragias, perdas sanguíneas entre as menstruações, assim como crescimento exagerado do útero e que a médio prazo poderá conduzir a uma histerectomia. Nestes casos, a ablação histeroscópica do endométrio apresenta sucesso espetacular.”

As vantagens da técnica

A vídeo-histeroscopia foi introduzida há cinco anos no Brasil, pioneiramente pela equipe da Skopia, constituída pelo Prof. Dr. Cláudio Basbaum e Drs. Ana Maria Morato Gagliardi, Ivani de Andrade Kehdi e Paulo Ayrosa Galvão Ribeiro, no Hospital e Maternidade São Luís, em São Paulo. Nos grandes centros médicos do exterior, a técnica é consagrada há 15 anos. Supera a histerectomia com muitas vantagens. Por ser menos invasiva (não requer a abertura do ventre da paciente), diminuiu-se o risco de infecção hospitalar, requer internação de apenas algumas horas, a recuperação pós-operatória é de dois dias e, sobretudo, preserva este órgão matriz feminino para continuar exercendo a sua preciosa função: a perpetuação da vida.

Não a histerectomia

A conceituada revista norte-americana Women’s Health publicou há alguns anos um artigo abrangente e esclarecedor intitulado 15 Razões Para Dizer ‘Não’ à Histerectomia, alertando para as conseqüências da retirada do útero: depressão, perda do desejo sexual, dores, insônia, obesidade, problemas urinários, fadiga, além do crescimento do risco de doenças cardíacas pelo aumento do colesterol, de falência dos ovários, de osteoporose e de disfunção sexual. Baseado na experiência dos especialistas, o artigo propõe 15 alternativas eficazes a esta cirurgia, como a histeroscopia, a terapia hormonal, a cirurgia a laser, exercícios etc.

É claro que a histerectomia continua sendo necessária, mas é preciso saber com certeza os casos em que ela é imprescindível. O Dr. Basbaum esclarece: “Quando a paciente está próxima à menopausa e apresenta o útero muito deformado, crescido e com muitos nódulos de fibroma; quando a presença do útero já não é tão importante e nos casos de câncer uterino, a histerectomia é indicada.” Ele ressalva: “Mulheres jovens, mesmo beirando os 40 anos, que apresentem pólipos, miomas e sangramentos uterinos anormais devem recorrer a recursos alternativos modernos e eficazes, já que a cirurgia de retirada do útero implica em riscos de infecção hospitalar, de lesões em órgãos adjacentes, de aderências pós-operatórias e de hemorragias.”

O especialista também observa que a perda deste órgão provoca o envelhecimento precoce dos ovários. A produção hormonal cai e a mulher histerectomizada pode sofrer mais cedo as conseqüências da menopausa, como, por exemplo, ter osteoporose, aumento do colesterol, riscos de problemas cardíacos etc. “Portanto, uma mulher que tenha indicação para a histerectomia não deve aceitá-la cegamente apenas porque o seu médico determinou. Ela tem o direito e a obrigação de consultar pelo menos mais um profissional de reconhecida competência e poder se beneficiar do avanço que a medicina lhe proporciona nesta área. Em princípio, diga ‘não’ à histerectomia até ter a certeza de que ela é a única solução para os seus problemas.”