Setembro Amarelo: combater o estigma e salvar vidas

O mês de setembro tem uma campanha importante voltada para a saúde mental: o setembro amarelo. Trata-se de um movimento que esclarece e conscientiza sobre a prevenção ao suicídio. Talvez vocês estranhem, eu, um ginecologista – obstetra, tematizar esse assunto. Mas, a verdade é que a saúde mental impacta em diversas áreas de nossa atuação médica e, por isso, no caso das mulheres, a depressão pós-parto merece a nossa atenção!

Embora, os quadros depressivos ainda sejam tratados como tabu e a paciente nessas condições seja vista muitas vezes como alguém “fraca”, “desanimada”, “desmotivada”, “perdida”… eu ressalto que a depressão é uma doença e precisa de tratamento adequado e contínuo, através de acompanhamento com psicanalista e, se necessário, com prescrição de medicamentos feita por um psiquiatra.

Com manifestações biológicas e emocionais, a depressão pode ter causas fisiológicas, às vezes com antecedentes familiares, e/ou também ser desencadeada após algum episódio traumático.

Seja qual for o gatilho, o quadro apresentado precisa ser tratado adequadamente para minimizar o sofrimento da paciente, evitar grandes problemas na vida pessoal, familiar e profissional e impedir situações dramáticas e irreversíveis como o filicídio e o  suicídio.

Gostaria de compartilhar com vocês algumas reflexões sobre a minha área, que é a ginecologia / obstetrícia. Já  atendi mulheres com depressão pós-parto. Muitas delas começam a entristecer e sentir que algo não está bem, já durante a gestação. Os hormônios começam a ter seus níveis alterados logo desde os primeiros momentos da fecundação, preparando o corpo da mulher para gestar o bebê e também criando condições, na vida intrauterina,  tanto para o parto quanto para a amamentação que ocorrerá dali nove meses.

Além de todas essas alterações físicas, que não são poucas, devemos nos lembrar que durante toda  gestação e com a chegada de seu  filho, são profundamente alterados muitos aspectos na vida pessoal desta mulher: a percepção sobre si mesma, a interação conjugal,  a relação com sua profissão, a vida social, a rotina…

Não é à toa, que muitas mulheres dizem renascer quando tem seus filhos.

Os primeiros meses depois do parto,  são intensos e igualmente desafiadores para esta fêmea que está se reconhecendo,  tentando se acostumar à nova realidade de uma vida atribulada, rotina alterada, horários insanos, novas responsabilidades, mais uma vez readequação do casal à vida conjugal, à nova família, além da possibilidade de desconfortos  físicos (seja no períneo, seja na cicatriz de cesárea ou sobre as mamas) e até mesmo insatisfação com sua aparência. Por isso, o suporte com informações antecipatórias,  trazidas  pelo obstetra e sua equipe, e a parceria e o apoio do companheiro, família e amigos é tão essencial!

A depressão pós-parto apresenta-se com as mesmas características de um quadro depressivo clássico: grande e persistente tristeza, perda de auto-estima e de motivação pela vida, fadiga excessiva e não justificada, sensação de culpa sem motivo aparente. Sua portadora poderá alimentar a ideia de suicídio, negligenciar os cuidados consigo mesma e com o bebê, ter pensamentos involuntários de machucá-lo, de abandoná-lo, e, até mesmo, em situações extremas, causar-lhe a morte.

Embora possa manifestar-se até mesmo um ano depois do parto, a depressão pós-parto ocorre, em geral, com mais intensidade entre o segundo e o quarto mês depois do nascimento do bebê.

Substâncias que proporcionam o fluxo de informações entre as células cerebrais, chamadas neurotransmissores, sofrem alterações nos níveis sanguíneos desorganizando o quadro responsável pelas sensações de bem-estar, relaxamento e estabilização do humor.

Mulheres com alterações severas de humor, a chamada tensão pré-menstrual (TPM), têm maior propensão para desenvolver a tristeza pós-parto ou mesmo a depressão pós-parto. Quase sempre existe correlação com a história pregressa de transtornos afetivos ocorridos antes e durante a gestação.

Mulheres com histórico de depressão pessoal ou familiar, aquelas que sofreram choques por perda dos pais ou de outras pessoas queridas, ou ainda quando os parceiros são indiferentes ou ausentes, têm maior risco de apresentar a doença.Quadro depressivo em gestações anteriores, correspondem a um risco 50% maior numa gravidez futura.