Dolce Morumbi traz o relato da importância da genuína paixão pelo ser humano no trabalho de médicos como o Dr. Claudio Basbaum

Um médico de vanguarda

dolci2Rafael preparava-se para a maior mudança de sua vida, pois deixaria o ambiente confortável e seguro em que se encontrava para ir ao encontro do desconhecido. Desejava uma viagem tranqüila e que sua recepção pelas pessoas que já amava pelo som das vozes e por um laço inexplicável fosse hospitaleira e acolhedora.

De outro lado, Fabiane aguardava na sala de parto do Hospital e Maternidade São Luiz. Uma música relaxante tocava ao fundo, o ambiente permanecia à meia-luz e ao seu lado encontrava-se seu marido, David, e seu sogro, Claudio Basbaum. Rafael, assim que nasceu, foi direto para o colo da mãe onde permaneceu refazendo-se do susto e tentando assimilar sua nova realidade. Tudo era uma experiência nova e, com fome, passou a sugar o seio materno.

Vozes conhecidas soavam baixinho ao seu lado quando mãos carinhosas o seguraram. Chorou quando sentiu seu corpo imerso num líquido transparente, mas cuja temperatura era agradável. O pai, David, dava o primeiro banho no filho, ali mesmo na sala de parto, enquanto era observado pela emocionada Fabiane. Basbaum, que nesse dia assistia o parto pelo método Leboyer, que ele mesmo trouxe ao Brasil na década de 1970, ajudou o filho e complementou o ritual. Ele deu o dedo de David para o bebê sugar despertando no pai uma série de sensações e sentimentos profundos, tão iguais quando do nascimento de sua primeira filha, Bruna.

O ginecologista-obstetra Claudio Basbaum, há mais de trinta anos, rompeu com paradigmas vigentes na medicina devida à sua paixão pelo ser humano e sua visão generosa sobre o relacionamento de mães com seus bebês. Há algum tempo, ouviu de um amigo médico: “Existem três tipos de médico: o que nasceu médico; o que estudou medicina e o que nasceu médico e teve a felicidade de estudar medicina. Você é o terceiro deles”. Basbaum, com seu jeito meticuloso, trabalha como quem se inspira para um quadro ou compõe uma música, dando o seu melhor, mas sem se considerar Deus.

Pernambucano e filho do empresário Naum, Basbaum tinha tudo para seguir a carreira do pai, mas certo dia ouviu dele: “Faça o que achar que deve ser feito, mas procure fazer o melhor”. No final de 1957, tomou sua decisão, foi fazer medicina na Universidade de Recife, hoje Universidade Federal de Pernambuco. Assim que concluiu o curso, o jovem médico veio complementar sua formação em São Paulo, no Hospital das Clínicas. Sua curiosidade o levou a se especializar, em 1966, no Hôpital Brocca, ligado à Universidade de Paris, onde estagiou com o “papa” da laparascopia – o professor Raoul Palmer –, adquiriu conhecimentos inovadores e desenvolveu técnicas humanistas.

De volta ao Brasil, certo dia, Basbaum, lendo uma revista francesa, fixou-se em um artigo escrito por um médico francês que estava revolucionando as condições de nascimento. Era Frédérick Leboyer, autor de “Pour une naissance sans violence” – “Nascer sorrindo”na edição brasileira. Leboyer, na época, era chefe de clínica e tinha uma vida atribulada. À procura de tranqüilidade, ele foi à Índia onde entrou em contato com técnicas regressivas. O médico reviveu as sensações de nascimento e concluiu que nascer era uma experiência impactante.

As palavras de Leboyer mudaram a vida pessoal e profissional de Basbaum, que passou a fazer partos utilizando o conceito de respeito ao nascimento, de direito ao aconchego da mãe e abolindo a estimulação desnecessária dos tapinhas. Suas experiências não foram bem recebidas por todos e ele foi proibido de atuar em um dos principais hospitais do país quando colocou um pai para dentro da sala de parto. Sua técnica incluía também que o bebê fosse imediatamente para o colo da mãe para receber aconchego e mamar. A importância do ato de amamentação nos primeiros minutos só foi reconhecida muitos anos depois pela Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).

Com pouco mais de um mês de nascido, Rafael, aos poucos se adapta ao novo mundo. No dia 16 de setembro fez uma visita inesperada ao avô Basbaum porque sua babá falhou o compromisso com a mãe Fabiane. Na presença dos netos, o avô, apesar de cansado com a rotina de cirurgias diárias, derrama-se em paparicos e tem certeza de que Rafael terá um desenvolvimento psíquico saudável com o carinho que recebe desde o nascimento. A atenção às necessidades naturais da mulher e a busca de segurança, paz e harmonia tornaram Basbaum uma figura pública procurada por artistas, intelectuais e formadores de opinião. Ele utilizou o método Leboyer em Baby do Brasil, Elis Regina e Maria Rita, que buscaram transformar o nascimento em uma experiência única e rica em emoção.

Aos poucos, Basbaum procurou complementos para o método Leboyer, como parto de cócoras, que conheceu ao visitar reservas indígenas das tribos Kaingangues e Guaranis, no Paraná, observando que era a melhor posição para parir. A isso foram a crescidas as idéias, divulgadas por Frédérick Leboyer, da Shantala – arte tradicional de massagem para bebês trazida da Índia por ele em 1976. Basbaum reuniu profissionais de várias áreas, como professores de educação física, de ioga, pediatras e psicólogos dentro de um conceito então novo de atendimento integral à gestante. Preparava-se não apenas para o parto, mas também para o nascimento.

Basbaum costuma dizer que obstetrícia é verso e ginecologia é prosa, mas nesta área trabalha também com uma medicina minimamente invasiva em que o profissional é parceiro, cúmplice, repensa a autonomia da mulher sobre o corpo e oferece informações sobre tratamentos não-mutilantes, respeitando a mulher física e emocionalmente. O inquieto médico foi um dos introdutores da laparoscopia no país. E, mais tarde, das evoluções desta, a videolaparoscopia e a videohisteroscopia, feitas com tecnologia que respeita os órgãos genitais femininos. Incansável, Basbaum continuou inovando. Ele fundou a Pró-Matrix (Unidade de Orientação, Preservação e Tratamento da Mulher) e lançou a campanha “Mulheres, salvem seus úteros”, com uma mensagem educativa a fim de evitar cirurgias desnecessárias impedindo o que chama de “mutilação”. O médico associou-se também a outros especialistas para criar a unidade Utherus, parte integrante de uma equipe internacional multidisciplinar que pesquisa o tratamento de miomas uterinos.

Por conta de seu trabalho, Basbaum foi citado por uma revista da área da saúde como um dos 2.000 médicos mais admirados do Brasil. Uma admiração que pode ser vista nos olhos dos netos Bruna e Rafael ao se depararem com o avô.